O
ATOR FAMOSO
Quando resolvi
escrever as Histórias do Quase, achei que a do dardo lá no colégio, tinha sido
o primeiro “Quase” importante de minha vida. Mas lembrei de outro quase que não foi tão por
pouco, mas também foi quase. Então lá
vai, uma estória que se passou em 1954... faz tempo, não?!
Meus simpáticos e
desocupados leitores devem estar imaginando que nessa época eu era bem jovem. Com
certeza... eu era um menininho, só não vou contar minha idade, porque... sei
lá, estou quase perdendo a conta!
A trepidante estória
que vou contar passou-se em Salvador, durante um congresso de cardiologia. Eram
eventos muito badalados, patrocinados por grandes laboratórios farmacêuticos e
outras entidades que davam bons descontos aos congressistas, com farta
programação social para distrair as famílias dos médicos participantes.
Meu pai já era um
cardiologista bastante conhecido, e lá fui eu no mês de julho, durante as
férias, com papai e mamãe, numa viagem inesquecível, cheia de surpresas e
eventos inusitados.
O primeiro lance,
foi a viagem de navio, que ainda era um meio de transporte bastante utilizado na época. Os grandes aviões quadrimotores eram uma novidade, mas uma
viagem num navio de passageiros era algo muito divertido e charmoso, desde que não
fosse lá na terceira classe.
Existia uma empresa portuguesa, a Companhia Colonial de Navegação que tinha dois lindos transatlânticos, feitos na Bélgica, que faziam a Rota do Ouro - Lisboa, Rio, Santos, Buenos Ayres - . Eram o Vera Cruz que nos levou, e o Santa Maria, que nos trouxe. Anos depois, o Santa Maria ficou famoso por ter sido sequestrado por rebeldes portugueses, comandados pelo capitão Henrique Galvão, que virou herói.
Existia uma empresa portuguesa, a Companhia Colonial de Navegação que tinha dois lindos transatlânticos, feitos na Bélgica, que faziam a Rota do Ouro - Lisboa, Rio, Santos, Buenos Ayres - . Eram o Vera Cruz que nos levou, e o Santa Maria, que nos trouxe. Anos depois, o Santa Maria ficou famoso por ter sido sequestrado por rebeldes portugueses, comandados pelo capitão Henrique Galvão, que virou herói.
A primeira coisa engraçada
ocorreu, logo após a partida. Ao que parece a classe em que viajávamos não
tinha camarotes para três pessoas, e assim meus pais ficaram numa cabine e eu
fui parar numa outra com um senhor bem velho. Evidentemente nem eu gostei de
ter que passar três dias num quarto com um velho e provavelmente menos ainda o
pobre ancião que se viu na companhia de um garotinho... Quando entrei na
cabine, o velho já tinha escolhido a cama, o pedaço do armário, o lugar de tudo
e eu lentamente enfiei minha malinha nalgum canto e saí para dar uma volta e ver o fabuloso navio.
Deslumbrado pelo ambiente
naval fui perambulando, entrando por corredores, abrindo portas com estranhas
fechaduras e grampos para prendê-las abertas, corredores inclinados, janelas
redondas, cheiro de navio por toda parte. Tombadilhos de cimento apoiados em
estruturas metálicas, passarelas de madeira, escadas inclinadíssimas... Lá ia
eu, com uma curiosidade infinita, passeando de lá para cá, quando finalmente
cheguei no rabo do navio... a popa. O fim de tudo. Aquela esteira de espuma e a
terra se afastando já distante. Nossa!... se alguém cai no mar já era... Havia
mais umas pessoas apoiadas na amurada, e a voz no alto falante insistia em
dizer para um garoto perdido da classe B (acho que era isso) procurar
seus pais.
Fiquei pensando... como
alguém consegue se perder num navio?? é só ir pra frente, ou pro lado... sempre
aparece alguém, aí é só perguntar... E lá fiquei hipnotizado por aquela
montanha de água se fechando depois da passagem daquele barco gigantesco.
Finalmente voltei
para a companhia do velho, e assim que entrei na cabina ele falou num linguajar
do qual mal consegui decifrar metade, algo que ser referia a eu encontrar meus pais numa sala que ele tinha anotado num papelzinho. Acho que eu
era bem espertinho, por que cheguei num instante no tal lugar, parecia uma sala
de leitura, ou uma pequena biblioteca e assim que minha mãe me viu, deu um
grito contido de alegria.
- Puxa! Onde você
se enfiou. Não ouviu a gente avisar no rádio?
- No rádio?!
- É.. eles avisaram
para o menino perdido vir para cá, já faz um tempão! Por que você não veio??
- Ué!... Eu não
estava perdido! Achei que não era comigo!!!
Mas a grande
surpresa mesmo foi no primeiro jantar. Ao entrarmos no chiquíssimo salão, cheio
de espelhos e corrimões impecavelmente dourados, reparamos que havia algumas
pessoas famosas além dos médicos conhecidos. Para entusiasmo
de mamãe, na nossa mesa estava nada mais nada menos do que o popularíssimo ator
Anselmo Duarte, que viajava sozinho. E minha mãe, que adorava artes, música, teatro, cinema e
já naquela época conhecia um monte de artistas, entabulou o maior papo sobre... sei lá, um diretor de cinema, um autor dramático, o compositor, e a arte... E o
famoso ator muito simpático e sorridente ia levando o papo numa boa. Eu achei
fantástico poder conversar com um sujeito famoso como aquele, que acabara
de fazer um filme que eu tinha visto no cinema.
Bem, meu leitor com
menos de 40 anos talvez não saiba, mas cinema na época era muito mais popular do
que hoje. Em São Paulo havia dezenas de cinemas espalhados por todos os bairros.
Eu mesmo morava numa rua onde havia um cinema a uns dois ou três quarteirões e
o programa dos sábados e domingos era assistir uma fita. As mocinhas como minha
irmã e minha prima, tinham as paredes dos quartos forradas de fotos de artistas
e entre elas estava lá a foto do nosso companheiro de mesa! Ali!!... batendo papo
com minha mãe e me perguntando coisinhas que os adultos sempre perguntam...
E assim grudei no
homem, e virei o amiguinho do famoso Anselmo Duarte na viajem de navio para
Salvador!!!
Quando chegamos em
Salvador ficamos no Hotel Bahia que, nas turvas imagens que sobraram na minha
memória, ficava numa praça muito grande e arborizada, mas bastante movimentada.
Era um prédio de seus dez andares, com vários salões, anfiteatros e na entrada
tinha algo parecido com um mezanino...
uma laje, naquele estilo de lajes curvas, usadas na época, onde as pessoas ficavam lendo seus jornais, revistas, batendo
papo, esperando alguém...
Acontece que, lá em Salvador, junto
com o congresso de cardiologia estava rolando um festival de cinema nacional e
um monte de atores famosos estavam hospedados lá, inclusive meu amigo Anselmo
Duarte, e a atriz com quem fez par romântico num dos filmes que estreavam no festival... nada mais
nada menos do que a deslumbrante Tonia Carreiro, com quem andei de elevador,
absolutamente embasbacado!!!...
Na frente do hotel, uma multidão absolutamente endoidecida, era contida a muito custo por cordões de isolamento, querendo ver de perto, mandar
beijinhos, pedir autógrafo, tocar em seus ídolos, e havia uma turma que se deixassem atacava mesmo.
Um belo dia eu
entrei no elevador para descer e encontrei com meu velho amigo Anselmo Duarte,
que sempre me cumprimentava alegremente... Estávamos só nós e o ascensorista que
desceu diretamente até o térreo. Acontece que ao sairmos do elevador a multidão
viu seu ídolo e se arremessou insanamente saguão do hotel a dentro.
Eu parei
estarrecido com aquela avalanche que vinha em minha direção, mas o Anselmo, me
agarrou pelo braço e praticamente me arrastou para dentro do elevador e gritou
para o ascensorista.. Sobe! Fecha a porta!
Mal deu tempo...
ainda ouvimos murros nas portas e aquela gritaria desvairada...
Quase que fui
pisoteado pelas fãs do grande ator.
No meu curriculum
deveria constar. 1954 - Salvo por Anselmo Duarte – Salvador – Bahia!
**Infelizmente, nunca
mais encontrei com essa grande figura do cinema nacional, que foi ator em
lindos filmes da Vera Cruz, como Tico-tico no fubá, onde foi Zequinha de Abreu.
Fez também o papel de um advogado abolicionista, que contracenava com a
lindíssima Eliane Lage, talvez a atriz mais bonita do nosso cinema.
Anselmo Duarte dirigiu um filmaço - O Pagador de Promessas - baseado num texto do grande Dias Gomes, ganhador do Festival de Cannes. Um filmaço mesmo! Vale a pena ver, ou rever!! Um filme muito bem feito!!! Roteiro, edição, direção de ator, fotografia, música... é um marco da cultura brasileira!!!
Anselmo Duarte dirigiu um filmaço - O Pagador de Promessas - baseado num texto do grande Dias Gomes, ganhador do Festival de Cannes. Um filmaço mesmo! Vale a pena ver, ou rever!! Um filme muito bem feito!!! Roteiro, edição, direção de ator, fotografia, música... é um marco da cultura brasileira!!!
Anselmo Duarte morreu velhinho,
meio esquecido... há pouco tempo.
Realmente, O pagador de promessas foi um grande filme e Anselmo Duarte, um grande ator. Adorei a sua história, Dario. Me fez lembrar dos anos 60, quando morei em Curitiba e era a companheira da minha mãe nos cinemas. Lembro que vi e revi vários filmes da Sarita Montiel. É por isso que gosto tanto de tangos. Abraços.
ResponderExcluirAssisti há pouco...
ResponderExcluirO pagador de promessas AINDA É um grande filme.
vale a pena ver!!!!