segunda-feira, 10 de maio de 2021

CONVERSAS NO BOTEQUIM

o anjo da guarda de Mika Peinkkennen

            - Meu amigo!... hoje aconteceu um fato absolutamente insólito que me fez refletir muito... sobre a vida, o mundo , o destino...

- Ih! Hoje ele está mais filósofo do que nunca.

- Mas é isso mesmo, a gente corre de um lado para o outro e esquece e pensar na vida... fica fazendo coisas importantíssimas, como por exemplo, ganhar dinheiro durante a semana e gastar tudo num super jantar, que no dia seguinte estará no esgoto.

- E aqui teu dinheiro vai mais depressa ainda, porque esse monte de cerveja não fica nem meia hora e já vai embora... Mas conte aí, meu. O que foi  que aconteceu de tão... assim...

- Olha o mais incrível nessa história são os pequenos  detalhes, as pequenas mudanças nos planos, que se não houvessem acontecido poderiam ter transformado completamente seu final.

-  Pô meu, não começa a enrolar muito. Vai conta logo, meu!

- Bem. Estava fazendo um calor desgraçado. Eu tinha acordado cedo para trabalhar. Queria aproveitar a brisa fresca da manhã que sopra na minha mesa, pois eu preciso de luzes fortes, que esquentam muito o pedaço. Então decidi trabalhar até o meio dia, dar um mergulho na piscina e ir até o centro pra encontrar com vocês logo depois do almoço.

- Isso que é vida de burguês! “Um banho na minha piscina...” É esse o cara que reclama da vida, e...

... e diz que é socialista. É isso aí. Piscina para todos! Banhistas do mundo uní-vos... É muito... Esse cara... Mas deixem ele continuar, que ele já enrolado naturalmente e com vocês interrompendo. Então...

- Vai! Continua, pô!

- Ó, primeiramente minha vida não é tão mole assim porque...

- Xiiii. Agora ele vai começar... Peraí turma. Vamos deixar ele falar!!
         - É, depois de ficar sentado várias horas na bancada, resolvi fazer alguma coisa lá fora para mexer um pouc0 o corpo. Aí peguei na enxada pra dar um trato na horta!

- Puxa, coitado! Ele é um pobre camponês oprimido que...

- Deixa eu contar, cacête! Então.. Já que estava lá fora, aproveitei para por umas roupas na máquina de lavar. E aqui estão os pequenos detalhes, porque mudei de ideia. Isso que é importante, mudei de ideia. Resolvi terminar as peças e deixar o nosso encontro para mais tarde, e voltei para a bancada e me concentrando para fazer umas coisas mais complicadas. Nessas, já era mais de duas horas, quando lembrei das roupas, que ainda estavam dentro da máquina.

Fui até o terraço pendurá-las. O vento quente estava formando nuvens escuras e trazia os gritos das crianças da chácara do vizinho. Mas de repente me dei conta que os ruídos das crianças estavam muito próximos... pareciam vir do portão da cerca interna, que separa minha casa do resto da chácara. Fiquei imóvel, prestando atenção. Eram uns gritinhos um tanto estranhos... percebi que realmente havia alguma criança perto desse portão.

- Caramba... Uma criança sozinha?! Eo os teus cachorros?

- Justamente, cara! Você conhece meus cachorros... eles são muito grandes, mas se for preciso passam pela cerca... Aí fiquei pensando que isso poderia dar algum problema, e fui lá falar com a figurinha, esperando que houvesse mais alguém com ele... Era um garotinho.

- Ei menino! – gritei – Olha, é perigoso você ficar aí. Meus cachorros podem.... Mas... puxa! Como você é pequeninho!!! Cadê a tua mãe?

-  Ah já sei como vai terminar tua estória... apareceu “aquela” mãe gostosíssima... o maior avião... encantou-se que você foi salvar o filhinho dela e se jogou nos teus braços...

- Que mãe, que nada! Não apareceu ninguém... e o menino era muito pequeno mesmo, mínimo. Estava bem vestido mas sujo e descalço. Aí o meu pastor passou pela cerca e avançou em cima do cachorrinho dele, um setter preto... filhotinho, que imediatamente virou de barriga para cima. E logo em seguida chegou o grandão.

         - O dinamarquês? Nossa...

- Bem, eu antes de tentar salvar o cachorrinho, agarrei o garoto e peguei ele no colo. Depois, a muito custo, madei os meus bichos embora... eles, apesar de obedientes foram para casa, meio a contra gosto. E eu fiquei lá segurando o carinha, que diga-se de passagem estava... cagadinho...

         - Ô... que legal...

- Imaginem vocês a cena! Duas e meia da tarde, eu sozinho na minha casa... e de repente acho um menininho  e um cachorro no portão... lá dentro da chácara! Pode uma coisa dessas?! Eu não estava acreditando... E agora? O que é que eu faço?

- Comecei a gritar... “ Tem alguém aí? Pode vir! Já espantei meus cachorros!” Mas..

-... e não apareceu ninguém...

- Isso mesmo... ninguém, cara. Aí percebi que o garotinho devia ter no máximo uns dois anos, e não falava nada, nem entendia o que eu falava...

-... não é possível, meu... Nadinha, nem o nome?

         Nada. Nada. Então saí correndo para a rua para ver se achava a mãe, um irmão, tia... sei lá, uma babá. Cheguei lá  fora olhei de um lado para o outro.  Ninguém, meu. E agora, pensei, só me falta essa! O que vou fazer. De onde será que vem esse moleque que mal consegue andar e nem sabe falar?

- E aí.. conta logo o que você  fez... e...

- Bem... naquela hora me passou um monte de coisa na cabeça... Tanta coisa esquisita poderia ocorrer...

- ... esquisito?... como, por exemplo?

- Então é justamente isso! O que vocês acham que poderia ter acontecido?

- Sei lá meu, a estória é tua. Você é quem sabe o que aconteceu, pô! Não diga que você inventou tudo isso e agora quer que a gente continue!

- Não inventei não, mas gostaria que vocês imaginassem o que poderia ter acontecido, caso as coisas tivessem se desenrolado diferentemente.

- Mas, vai logo, caramba. Conta antes o que aconteceu de verdade!

- Olha eu primeiro pus o garotinho no chão e perguntei para ele onde era a casa dele. Mas, como já disse, ele não falava nada. Depois apontei enquanto perguntava “ é pra lá? Mamãe é lá? ... mamãe... lá?” E o carinha completamente mudo.

Resolvi não insistir muito para não assustá-lo. Vocês já imaginaram se ele começasse a chorar? Se passasse alguém até poderia achar que eu estava raptando, ou judiando do menino. Bem, aí fui até um vizinho, lá na frente, onde se que tem crianças. Chamei, gritei... mas não apareeceu ninguém. Então fui até a casa de um outro conhecido, o Perrino.

- Assim que me viu perguntou, meio na caçoada, se eu tinha arrumado mais um filho... Quando contei o que tinha acontecido, mal acreditou. Levamos o menino para dentro para que a mulher e a filha dessem um trato no garoto e saímos para a rua levando o cachorrinho setter. O Perrino falou:

- O garoto se perde, mas o cachorro sabe voltar para casa.

E lá fomos nós andando atrás do cachorrinho, que estava meio indeciso se pulava em cima da gente ou ia para casa. Logo passamos na frente de uma obra e perguntamos para os peões se eles timha visto um menino passeando com o cachorrinho.

- Vimos sim! É da casa lá da frente. A dona sempre deixa eles aqui brincando na areia. Mudaram pra cá faz pouco tempo.

- Tá vendo só! É a norueguesa que mudou outro dia... essa mulher é uma irresponsável, uma isso e aquilo... E nós dois ficamos falando mal da fulana, enquanto íamos até a casa da cidadã. Gritamos, batemos palma, gritamos de novo... e nada. Ninguém em casa.

- Não é possível! Isso é demais!- eu e o Perrino estávamos revoltados resmungando contra a mãe do garotinho – essa mulher é uma cretina. A gente devia dar parte dela no juizado de menores. Ou então levar o coitadinho na polícia. É uma idiota... Como é possível?!! A mãe sair de casa e deixar o filhinho que não tem nem dois anos sozinho!!! Uma... e... soltamos o verbo contra a norueguesa...

Voltamos para a casa do Perrino, que ao passar na frente da obra avisou a turma que o filho da doida estava na casa dele.  Só que... nisso  vem chegando a maior tempestade, com aquele vento fortíssimo.

- Olha, Zé – falei pro Perrino – vou dar uma passadinha em casa para fechar as portas, as janelas e desligar os aparelhos das tomadas, porque você sabe o que acontece se começar a cair raio por aqui. Depois vou para a tua casa e aí a gente vê o que faz.

- Fui correndo para casa, troquei de roupa, fiz o que tinha que fazer sempre que caía tempestades, e corri para lá, quando já estava começando a chover.

- E depois? A mãe do carinha chegou e daí... ?

- Não! Quem chegou foi o irmão mais velho, o Olaf, que tem uns quinze ou dezessei anos. Ele deveria estar cuidando do irmãozinho, mas adormeceu na frente da televisão e quando acordou, percebendo a ausência do menino saiu procurando. Procurou na casa inteira, e quando foi para a rua, todo afobado buscando o irmãozinho, os operários avisaram que nós estávamos com o Mikinha.

- A Deisi, mulher do Perrino, foi conversar com o Olaf, que ia tomar “aquela” bronca, mas se safou porque a chuvarada estava chegando.

- Bom. Então tudo acabou bem... e aí? Você disse que ia contar um lance fabuloso e...

... o menino realmente teve muita sorte, pô!

_ Mas olha, gente... é isso que achei demais. Foi muita sorte! Se eu não tivesse mudado meus planos e tivesse vindo encontrar você mais cedo, com estava meio combinado... Vocês já imaginaram tudo o que poderia ter acontecido com o molequinho?! No mínimo iria tomar aquela chuva toda... os meus cachorrões poderiam avançar nele, estraçalhar o filhote de setter. E o pior seria se ele fosse para a horta onde tem aquela cisterna sempre mal tampada. Ele poderia ter caído lá... O Mikinha quase se ferra! E poderia também....

- Hiii meu.  Qual é?! Você então vem aqui e conta uma estória que poderia ter acontecido, talvez pode ser..

- Ah! Qual é a tua meu!!!

Mas aí, adentra uma jovem senhora loira muito bem vestida, e bonitona... Dá uma olhada pelo restaurante,  dirige-se à nossa mesa, coloca a mão sobre o ombro de um dos que estavam sentados e lhe dá um selinho... O nosso amigo levanta, cede o lugar para a beldade, dá um sorriso e fala...

- Gostaria de lhes apresentar a Ulla, mãe do Mikinha!!!

- ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! ! !

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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